Diabetes Mellitus Tipo 1
O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é uma condição rara, totalizando menos de 5% de todos os casos de diabetes. O DM1 acontece devido a destruição das células do pâncreas, responsáveis pela produção de insulina. Esse processo é mediado pelo próprio sistema imune do indivíduo, que por alguma falha, acaba não reconhecendo o pâncreas e o atacando como se ele fosse algo que não pertencesse ao corpo. Ainda não é 100% esclarecido o que provoca esse fenômeno, mas é sabido que algumas infecções virais podem aumentar o risco dessa resposta errada do organismo.
Como consequência à falta de insulina, o açúcar no sangue se eleva, gerando diversas consequências a curto, médio e longo prazo, como maior risco de complicações microvasculares tais como retinopatia, nefropatia (doença renal) e neuropatia diabética, além das lesões de grandes vasos, aumentando o risco de infarto, derrame e doença arterial periférica.
DIABETES TIPO 1: SINTOMAS, DIAGNÓSTICO E MANEJO
QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS SINTOMAS DO DIABETES?
Os principais sintomas do diabetes são:
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Poliúria (aumento da frequência e volume urinário)
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Polidipsia (aumento da sede)
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Polifagia (aumento da fome)
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Perda de peso
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Maior suscetibilidade a infecções
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Alterações visuais
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Alterações na sensibilidade e formigamentos
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Atraso na cicatrização de feridas
Apesar da maioria dos casos de diabetes ser diagnosticado de forma assintomática em exames de rotina, no diabetes tipo 1 o diagnóstico costuma acontecer justamente pela presença de sintomas, podendo inclusive se iniciar após um estresse físico grande como um trauma ou infecção que desencadeia a descompensação do quadro e elevação da glicemia.
É frequente que o diagnóstico aconteça frente a uma situação chamada de cetoacidose diabética, uma complicação grave que acontece devido à falta de insulina no organismo.
QUAL A DIFERENÇA DO DIABETES TIPO 1 PARA O TIPO 2?
A diferença do diabetes tipo 1 para o diabetes tipo 2 é que o tipo 1 se inicia pela destruição autoimune das células do pâncreas, levando a deficiência da produção de insulina. Já no diabetes tipo 2, forma mais comum, o início da doença é desencadeada pela resistência à ação da insulina e em 90% dos casos está relacionado ao sobrepeso ou obesidade.
DIABETES TIPO 1
- Ocorre geralmente em indivíduos mais magros;
- Acontece geralmente antes que o diabetes tipo 2, se iniciando na infância, adolescência ou em adultos jovens (mas pode ocasionalmente ocorrer mais tardiamente);
- Grande parte se inicia com sintomas como aumento da sede, fome, perda de peso e aumento da frequência urinária. Pode também se iniciar com um quadro chamado cetoacidose diabética (CAD);
- A dosagem de auto anticorpos como o anti GAD e anti IA2 frequentemente são positivos;
- Requer o uso de insulina desde o início do diagnóstico ou comumente em até 6 meses e as medicações orais não estão indicadas na grande maioria dos casos
DIABETES TIPO 2
- Ocorre sobretudo em situações como o excesso de peso e maior predisposição genética. Pessoas com diabetes tipo 2 possuem, ao diagnóstico, produção normal ou até elevada de insulina para vencer a resistência à sua ação.
- Inicia geralmente em adultos e indivíduos mais velhos;
- A maioria é assintomática ao diagnóstico;
- Costuma se associar a outras alterações como aumento do colesterol ou triglicérides, hipertensão, obesidade e gordura no fígado
- O tratamento inicial na maioria das vezes pode ser feito sem necessidade de insulina;
- A história familiar costuma ser mais forte que no tipo 1
QUAL O MELHOR TRATAMENTO PARA O DIABETES TIPO 1?
O melhor tratamento para o diabetes tipo 1 é o manejo com insulina. Nessa condição há pouco espaço para medicações por via oral, já que o problema está justamente na falta de insulina.
Existem diversos tipos de insulina, como a NPH, Levemir (Detemir ®), Degludeca (Tresiba ®) Regular, Asparte (NovoRapid®), Lispro e Fast Asparte (Fiasp ®).
A dose total diária varia de acordo com a idade, peso, condições associadas e na gestação. Comumente utilizamos doses entre 0,5 a 1,0 unidade/kg/dia, divididas entre insulina basal (as de mais longa duração) e insulina prandial (das refeições, de ação rápida).
A forma mais segura de tratamento é a combinação de uma insulina de longa duração como a glargina ou a degludeca e análogos de ação rápida ou ultrarrápida, como lispro, asparte e fiasp. Essas insulinas estão associadas a menores índices de hipoglicemia, porém é importante destacar que elas não são superiores quanto ao controle glicêmico e, mais do que a insulina em si, o que é fundamental para se atingir um bom controle é a educação em diabetes e a alimentação adequada.
CONTAGEM DE CARBOIDRATOS
A contagem de carboidratos é uma forma de se oferecer maior autonomia na vida dos pacientes com diabetes tipo 1. Devido a necessidade de se utilizar insulina em todas as refeições, a contagem permite que o indivíduo com DM1 possa escolher diferentes opções de alimentos em seu dia-a-dia, uma vez que a dose de insulina da refeição se torna variável e proporcional à quantidade e tipo de alimento.
Para iniciar a contagem, é importante que o paciente esteja disposto, pois é necessário o treinamento e aprendizagem. Existem diversos Apps (como o App da Sociedade Brasileira de Diabetes) ou manuais que indicam a quantidade de carboidratos presentes nos alimentos e a proporção (relação insulina/carboidrato) é determinada nas consultas com o diabetologista/endocrinologista. Essa proporção não é fixa e pode variar de pessoa a pessoa, bem como de acordo com a fase da vida e diversos fatores, sendo comum para um mesmo paciente ajustarmos diversas vezes ao longo de um ano.
COM QUE FREQUÊNCIA É NECESSÁRIO MEDIR A GLICEMIA?
Depende. Em geral, indivíduos que fazem contagem de carboidratos devem sempre fazer medidas antes das refeições para o ajuste correto da dose. Porém naqueles que utilizam doses fixas de insulina, a frequência de aferições varia - se o controle está bom, pode ser realizado de forma menos frequente. Em geral, recomenda-se pelo menos que 2 a 3 vezes na semana as glicemias sejam verificadas e sobretudo nos dias que antecedem a consulta médica, conforme combinado com o médico.
O QUE É O LIBRE®? É INDICADO UTILIZAR NO DIABETES TIPO 1?
O Freestyle Libre® (Abbott ®) é um monitor contínuo de glicemia (CGM) intersticial, ou seja, que mede a glicemia “embaixo da pele”. Seu sistema é “flash”, o que significa que é necessário o escaneamento para a aferição da glicemia, apesar de registrar a curva da glicemia o tempo todo, 24h por dia. No Brasil, é o único modelo amplamente disponível para uso e o sensor dura 14 dias, precisando ser trocado depois.
Seu uso pode ser indicado no seguimento do diabetes tipo 1, uma vez que sua acurácia e correlação com a glicemia capilar (medida do dextro, ou “ponta de dedo”) são ótimas, melhorando de forma significativa a qualidade de vida ao minimizar a frequência das medidas de glicemia no dedo.
Naqueles que estiverem em uso do monitor contínuo de glicemia, a meta é que pelo menos 70% do tempo a glicemia permaneça entre 70 e 180 mg/dL, com menos de 5% de hipoglicemias e menos de 25% do tempo acima de 180 mg/dL.
Fonte: Sociedade Brasileira de Diabetes, guidelines 2023
O QUE É E QUEM DEVE USAR UMA BOMBA DE INSULINA?
A bomba de insulina, ou sistema de infusão contínua de insulina (SICI) é um dispositivo eletrônico capaz de infundir insulina de forma contínua no subcutâneo, por meio de um cateter que fica inserido na pele, geralmente na região do abdome. O médico diabetologista/endocrinologista normalmente ajusta a taxa de infusão de acordo com o horário do dia e o paciente consegue aplicar bolus selecionados por um dispositivo de controle ou mesmo na própria bomba para cobrir as refeições. Existem diversos modelos, marcas e as bombas vem evoluindo muito nos últimos anos, sendo que já existem alguns tipos chamados de “alça fechada” que conseguem estabelecer a taxa de infusão de acordo com a glicemia, evitando hipoglicemias, reduzindo hiperglicemias e atingindo um excelente controle com maior qualidade de vida. No entanto, esses modelos não são amplamente disponíveis e seu custo pode ser extremamente elevado.
Nem todos os pacientes com diabetes tipo 1 se beneficiam do uso da bomba. Em primeiro lugar, é fundamental haver uma boa educação em diabetes para que seja possível fazer a correta aplicação dos bolus, contagem de carboidratos e compreensão sobre correções em momentos de hiperglicemia.
As principais indicações são:
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Crianças menores que 7 anos (mas idealmente todas crianças e adolescentes podem se beneficiar);
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Hipoglicemias frequentes e/ou graves;
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Fenômeno do alvorecer;
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Variabilidade glicêmica importante mesmo com tratamento otimizado e excluídas outras causas;
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Necessidade de baixíssimas doses de insulina
Os guidelines variam quanto à recomendação precisa. Contudo, a tendência é que cada vez mais vejamos a introdução de tecnologias em diabetes no dia-a-dia pelo benefício que tais ferramentas podem agregar.
Uma das principais preocupações ao se tratar o diabetes é com o risco de hipoglicemia. Hipoglicemia é o termo utilizado para a situação onde o açúcar no sangue está muito baixo, gerando sintomas como sonolência, lentificação do raciocínio, tremores, sudorese fria e até mesmo convulsões ou coma, se a glicemia chegar a níveis extremamente baixos. Por isso, é importante que pacientes com diabetes tenham em casa um glicosímetro (aparelho de medir as glicemias) e chequem o dextro sempre que se sentirem mal ou com algum sintoma suspeito.
Se a glicemia aferida estiver abaixo de 70 mg/dL, podemos dizer que o paciente está com hipoglicemia. Nesse caso, é importante fazer a correção dos níveis de açúcar no sangue a partir da ingestão de 15 gramas de um carboidrato que tenha rápida absorção. Na prática, as melhores opções são:
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1 copo de 200 ml de água com 1 colher de sopa rasa de açúcar OU
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1 copo de 200 ml de suco de laranja OU refrigerante (não diet) OU
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3 balas de caramelo
Após 15 minutos, devemos checar novamente a glicemia. Se já estiver normalizada, o paciente deve então consumir um alimento leve como um lanche. Se ainda estiver abaixo de 70mg/dL, é preciso repetir o procedimento e se mesmo assim não houver sucesso ou o paciente estiver inconsciente, é fundamental o rápido acionamento do SAMU e encaminhamento à emergência.
Vale ressaltar que a correção não deve ser feita com chocolate, leite ou doces elaborados que contenham muita gordura ou proteína, pois o açúcar pode demorar demais para subir e pode desencadear uma hiperglicemia posteriormente.
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Referências:
1. Pititto B, Dias M, Moura F, Lamounier R, Calliari S, Bertoluci M. Metas no tratamento do diabetes. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2022). DOI: 10.29327/557753.2022-3, ISBN: 978-65-5941-622-6.
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3. ElSayed NA, Aleppo G, Aroda VR, Bannuru RR, Brown FM, Bruemmer D, Collins BS, Hilliard ME, Isaacs D, Johnson EL, Kahan S, Khunti K, Leon J, Lyons SK, Perry ML, Prahalad P, Pratley RE, Seley JJ, Stanton RC, Gabbay RA, on behalf of the American Diabetes Association. 2. Classification and Diagnosis of Diabetes: Standards of Care in Diabetes-2023. Diabetes Care. 2023 Jan 1;46(Suppl 1):S19-S40. DOI: 10.2337/dc23-S002. Erratum in: Diabetes Care. 2023 Feb 01;: PMID: 36507649; PMCID: PMC9810477
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